segunda-feira, 29 de março de 2010

Saudade de cão

Por esses dias, fui convocada para fazer companhia ao cachorro da sogra, o Chico. Ele é um Cocker Spaniel, com 10 anos. Chegou à família ainda bebê e é muito, muitíssimo apegado à mãe dele. E, apesar de ser um tantiiiinho diferente de um Poodle Toy branco e descompensado, com dentes prognatas, me fez lembrar o Gustavo, o meu Guga (que também já tá velhinho).


Estar na casa de outro alguém, com a família de outro alguém e até o cachorro de outro alguém – por mais dessemelhante que sejam espaço, pessoas e raças – me faz lembrar a minha. E lembrar também o quanto eu me sinto, muitas vezes, filha de uma chocadeira nessa cidadona que não tem fim. Sem referências, sem os que me conhecem menos superficialmente. E sem o meu ensandecido Guga, que me fez companhia, acordado ou dormindo apoiado nas minhas costas, por tantas e tantas noites, tantos (e quantos!) anos.

Não nasci e não cresci aqui, nessa tal de São Paulo. O meu parto cesariano não foi feito naquele hospital perto da Av. Paulista ou da Nove de Julho e menos ainda de uma avenidona cheia de glamour. O meu pai não saiu gritando em 1982 “nasceu, nasceu a Miss Brasil 2000” nas ruas desta cidade (tadinho, gente!). Não sou nem filha única, quem dirá uma princesa Barbie que sempre teve tudo o que quis.

Mas também não pensem que passei por tantas necessidades assim: sempre tive aquelas coisas que não se compram, sabe? Além de bonecas, aulas de balé e inglês. A questão aqui não é dinheiro.

Não estudei naquela escola da esquina. Naquela universidade particular então, nem pensar! E você acha que frequentei os bares da redondeza com os amigos quando deveria estar na sala de aula? Ah vá! Não conheço aquele moço da tevê. Não sou conhecida do manobrista daquele estacionamento, sabe qual é? Aliás, nem carro eu tenho e, do jeito que anda o holerite, acho muito improvável mesmo conseguir comprar o primeiro antes dos 35 (e olhe, olhe!). Ah, e sabe aquela balada que fica naquela rua, perto daquela outra balada que as pessoas mais badaladas vão? Também nunca fui!

Não brinquei naquelas ruas, não andei de bicicleta ou patins. Menos ainda de brinquedos eletrônicos (nunca ganhei um). Gente, e aquela marca de roupa ou de chocolate que eu nem sabia que existia até três anos atrás e que por aqui já era moda desde os anos 80? Eu sou uma ET!

A verdade é que tenho fugido da aproximação dos meus nos últimos tempos: sem muitos telefonemas, e-mails ou sinais de fumaça. Tenho provocado essa distância, nem tão inconsciente assim. Porque essa aproximação, quando se está distante fisicamente, dói. E como tudo nesse mundo de Deus (que, pra mim, tem o D maiúsculo) é paradoxo, a presença deles, ainda que fisicamente distante, me fortalece.

Por esses dias, quem dormiu comigo, tranquilão, me lembrando tudo o que eu tenho e o que eu não tenho aqui, foi o Chico. Até roncou! E, temporariamente, isso nos bastou – a ele e a mim. Tudo bem que, quando a mãe dele, o safado não quis mais conversa. E ficou bem bravo quando me aproximei para me despedir... exatamente como o Guguinha faria.

Nem as músicas do Chico – seja Buarque, César ou Science – me transportaram para uma viagem melancólica tão ao cerne do centro do núcleo de mim mesma quanto o Chico, que é só Chico. Vôte!

4 comentários:

.ailton. disse...

guga é mais bonito

Rachel disse...

E vc acha que o seu paulistano não se encanta por vc ser diferente de tantas espalhadas por aí?

Sei que é difícil ficar deslocada e com essa sensação de não pertecimento, mas enfim... vc tem agora tantos mundos.

beijos

Jr disse...

Você não está só nunca, não esqueça de lembrar disso.
E quando essa sensação de deslocamento aparecer CANTE. Cante uma música alegre, cante uma música que lembre de coisas boas. Cante e vá para seu mundo verdadeiro, um mundo que somente os bons de alma sabem chegar, e você é ótima de alma. Você É. Isso basta!

Mirna Nóbrega disse...

eu te entendo, ô se entendo!

e apesar de João Pessoa já ter despertado o mesmo sentimento e o Rio um pouquinho também, aqui nessa cidade onde tudo é muito, a saudade é ainda maior..e não tem o mar pra pousar a vista e esquecer das mazelas..

será que um dia a gente se esbarra por aqui?

beijos